quinta-feira, 28 de maio de 2015

Do escuro intermitente

Atiro-me inconsequentemente em teus braços.
(não por acaso um precipício)
O que mais pode-se querer?
Paz mundial, reconhecimento
um milhão de (coisas) reais
da árvore que ejetou (esses frutos)
essa flor (do mal) querer, e o despertar
(tanto mar) que me tem (acompanhado,
atado, embaraçado) e por fim,
desfaz-me de mim mesma
solitária sombra silente na
incorpórea presença de quem mente.
E quem foge (em meio ao matagal
à meia-luz) sem lentes,
se imiscuindo em meus nascentes.
Falésia!
Falácia
do falo impróprio
despencando
(ipsis litteris)
em meu abismo siléptico,
abrupta hipótese mimética.
Qual geleira impera?
(meu verso, teus olhos, o toque!)
És terra, mar, sal e água
permanente erosão (ação irreversiva)
não (me) esca(r)pas!
E o trato digestório (caminho que percorres)
que rumina tua saliva é
preenchido por insetos e lascívia.

quarta-feira, 27 de maio de 2015

prevenção

o pranto desata na antessala,
cortando ouvidos indiferentes
de figuras cinzas em meio
à espera contida em
cadeiras cor de mofo
- fica quieta, menina -
eu sempre sofri,
mas agora é de se esconder o choro.

Já passou o tempo de tomar a vacina.

Atiro indecentemente distopias silenciosas
num lugar onde
Hipopótamos perdidos voam.

sábado, 23 de maio de 2015

orgânico

Sobre aquilo que não significa e não me assola.
Nada e Nunca Mais,
monstros de dentro do armário que agora saem para brincar.
A minha capacidade infinita de sentir afeto,
a minha espera contida e desesperançada,
minha leveza inexprimível.
Terei de inventar um novo vocabulário,
ou deixar de ressentir as palavras que já conheço.
Como fazer justiça a todos os amores inesgotáveis
que sorvi com lascívia e regurgitei com escárnio?
A celebração da minha partida é minha maior força,
pois que não posso estar enganada.
Mitologias, erudição, Sul.
A palavra não é o amor.
Não pode ser pois já estive errada;
é preciso estar livre, é preciso poder partir.
É preciso medir algum tempo que não seja teu.
Que venham os calendários e a passagem dos dias:
o tempo estático independente do referencial.
Chá de canela, ensaios, tipologias,
o ruído suave da clepsidra – sed de ubicuidad,
sucedidos pela relatividade e o entrelaçamento quântico.
[E todas as frases que eu roubei de Hilst e Borges e Cortázar]
Pata de coelho, búzios, chá de arruda;
que se cure a racionalidade imposta e as racionalizações.
A sede de ser outra saciada pela plenitude do Eu.
A vontade de ser água, sendo terra
amável, embora feita de pedra.
Orunmila sussurrou seu nome em meu ouvido!
E me contou da existência de outros Orixás.
Contiguidade – ipseidade,
espaldas, omoplata, olho – reflexos.
Concerto 2 opus 18,
capacidade humana de dizer e fazer coisas belas.
Bússola, métrica, pêndulo
conjugados na inevitabilidade do caos.
Ah, tá!
O que eu entendi:

você é meu talismã.

quarta-feira, 20 de maio de 2015

Publique ou pereça

Será que o mundo já tem mais estacionamentos do que mar?
Meu melhor amigo não é Sartre
[Mas Simone]
Ah, como eu odeio abelhas.

domingo, 17 de maio de 2015

Das XVI. Sonett

Du, mein Freund, bist einsam, weil….
Wir machen mit Worten und Fingerzeigen
uns allmählich die Welt zu eigen,
vielleicht ihren schwächsten, gefährlichsten Teil.
Wer zeigt mit Fingern auf einen Geruch? –
Doch von den Kräften, die uns bedrohten,
fühlst du viele… Du kennst die Toten,
und du erschrickst vor dem Zauberspruch.
Sieh, nun heißt es zusammen ertragen
Stückwerk und Teile, als sei es das Ganze.
Dir helfen, wird schwer sein. Vor allem: pflanze
mich nicht in dein Herz. Ich wüchse zu schnell.
Doch meines Herrn Hand will ich führen und sagen:
Hier. Das ist Esau in seinem Fell.

Rainer Maria Rilke, zwischen dem 2. und 5.2.1922, Chateau de Muzot

quarta-feira, 13 de maio de 2015

ποίησις

Meus amigos me chamaram para dançar.
Que convite absurdo!
Mal sabem que me desfaço no descompasso dos semi-abraços,
me retorcendo no cadafalso,
abjeto, inconfesso, ilusório,
que são as palavras que se propagam cortando o vento,
úmido, abafado, desritmado.
Minhas palavras que não valem nada,
sem seu valor simbólico, teórico, metafórico.
Não mudam realidades, não habitam tuas noites de insônia.

Minhas amigas me dizem para resistir.
Que infâmia!
Insistir nesse mundo de absurdos,
perjúrios abjetos lamentos.
-Moça, não quero interromper, mas me dá um trocado?
Palavras não mudam realidades,
perpetuam o purgatório, pusilânime
estado de espírito civil. Antissocial, com ideais anárquicos
hipócritas, hipocondríacos, ingênuos.
-Moça, eu tenho AIDS.
A poesia é a mais covarde fuga.
com métrica aristocrática, incompreensão socrática,
pretensão pluripatética.
Principalmente quando fala do escarro,
do esterco, dos porcos, dos corvos e dos medos.
-Moça, tá faltando o leite pras crianças.
EU sou o deus hermético,
você é súplica obtusa.

Resistência infame, herética, produzindo a bile fétida,
que escorre no meu bule de porcelana e chá de lótus.
Basta de palavras!
Esta é a noite para cingir todos os desencontros,
toda rima, métrica, poiesis
ao compasso de minha dança cadavérica.

terça-feira, 12 de maio de 2015

Só.
Tentei escrever o dia todo e a única palavra que me ocorre é que estou só. Povoo os inúmeros espaços vazios dessa cidade com todos aqueles que me deixaram – ou que eu deixei, nunca se sabe. Sou um fantasma de mim mesma. Me comprimo num balanço quebrado e seu rangido ressona em meus pulmões preenchidos por ar frio.
“Parquinho infantil, proibida a entrada de adultos”, diz a placa.
Tento me encolher pra dentro de mim, pequenina. Eu, que antes não me cabia, agora nem sequer me preencho. Vejo os últimos raios de luz cederem espaço para a noite.
E só. Nada me comove, indiferente (embora dolorido) é meu estômago frente ao pedaço de pão. Os desconhecidos que me encaram não me enojam tampouco me apavoram. Não procuro uma resposta – minhas perguntas cessaram.
Os ínfimos feixes alaranjados tingem o céu azul de violeta.
Me lembro de você.
Habituada à minha solidão como a única certeza, exaspero-me frente à essa nova expectativa. Vislumbro as esferas as quais você mencionou. Criadas por mim. Pelo meu silêncio. Tenho ânsia de capturar esse tom violeta em ti. Olho ao longe mais uma vez e ele já se dissolveu no azul. Lá se foi nosso éden da compreensão. Mas lá ainda repousam suas mãos nas minhas. Meus dedos pálidos em seus cabelos pretos. Seus dedos longos convulsivos, esquizofrenicamente manuseando mundos. Tecendo tramas que não me dizem respeito. Envoltos por anéis incógnitos para mim, que desvelam o nó em meio ao meu nós ideado. Esferas invisíveis de medo.
Recolho meus objetos e sentimentos e sigo só. O frio outonal transportado pelo vento úmido faz com que se recolham também as pessoas que passearam ao meu redor.
Quer dizer então que eu sou a primavera?

Coup de foudre ou de grâce ?

Je bois tes larmes chauds

Je rêve que je t’embrasse

Et alors quand t’es là,

Je ne porte que des masques.

En regardant tes doigts longs,

il n’y a quoi dire,

il n’y a rien a faire,

il y a seulement mes yeux fatigués,

et tes beaux doigts:

ils manient le monde.

Devant cette force inéluctable

mon âme se dissoudre,

et mon coeur irrésolu demande :

Sois miséricordieu !