quarta-feira, 14 de dezembro de 2011
Desconhecimento no descompasso
Percebera que não havia mais aquela espontaneidade entre elas quando já era tarde demais. Passara muito tempo falando sozinha, errante nos seus zigue-zagues verbais, dando voltas em sua mente. Uma mente que não mais estava em sintonia com àquela outra que sempre estivera conectada diretamente à sua. O baque fora tão violento e profundo que ainda encontrava-se confusa e perdida em função dele. Elas ainda podiam olhar para os outros à distância, rir em unissono e compartilhar aquele olhar que gritava "não entendo essas pessoas". Mas não era mais o suficiente. Ao mesmo tempo em que o desejo de dividir tudo era sufocante, sentir os prenúncios da discordância e de uma discussão faziam com que ela o reprimisse. Agora mais nada era espontâneo. Era tudo programado e falsificado - as pequenas etapas do convívio ordenavam-se pausadamente, intercaladas por silêncios polidos.
Repentinamente sei o que quero com certeza certeira. Até que obstáculos na execução começam a se apresentar e até que eu comece a me questionar, e questionar a tudo e a todos, de tal modo que me perco na indecisão. Encaro meu reflexo com certo espanto, certa hesitação. Penetro um olhar opaco e indiferente com frieza. Dificultoso é ter consciência de mim mesma, lembrar de um momento - que eu imagino pré-existente - em que houve a certeza certeira de quem sou, ou quem costumava ser. O que eu sabia era que devia levantar e começar a me equilibrar sobre meus próprios pés. Tive consciência de uma coisa pelo menos:
Sei o que quero, mas sou covarde.
Sei o que quero, mas sou covarde.
terça-feira, 15 de novembro de 2011
Criptico Indecifrável
Queria dar um mute nas suas palavras, despi-lo das aparências, desnudá-lo até que perante a si só restassem seus olhos nus. Poderia, então, aprofundar-se naquele olhar e compreender o que realmente estava acontecendo, sem a intervenção das palavras, dos zumbidos, dos terceiros. Não seria necessário perguntar o que ele estava pensando, ou empenhar-se para sustentar um diálogo vazio; se todos os empecilhos fossem destruídos, acreditava então ser possível olhá-lo nos olhos, e ver através de sua transparência límpida e azul as respostas, o entendimento mútuo. Seus olhos opacos, contudo, constituíam algo como um críptico indecifrável.
Percebi então a tolice que fora regozijar de sua escuridão esperando que ela pudesse se encontrar com a minha.
Percebi então a tolice que fora regozijar de sua escuridão esperando que ela pudesse se encontrar com a minha.
Mais cinzas
Ela se lembrava bem daquele gosto amargo de cinzas. No início, apenas representava acesso a uma realidade pertencente a um submundo que até então lhe fora desconhecido, obscuro e misterioso e, ao mesmo tempo, sedutor em sua promessa de subversão. Agora que se acostumara com o gosto, sabia que havia sido uma promessa vazia. Era capaz de sentir a morbidez e o mal estar a medida em que as cinzas se acumulavam, produtos de um fogo que consumira a si próprio. E cinzas eram apenas cinzas, restos mortais daquilo que um dia poderia ter sido.
segunda-feira, 7 de novembro de 2011
Cinzas
O otimismo estava fora de época. Quando se podia sentir a decadência no ar pesado e sujo ao redor, o mal estar era quase que instantâneo. Ele distinguiu a silhueta dela em meio a fumaça. Lembrou-se de esperas prévias em que a tensão dos meses de expectativa finalmente tornavam-se palpitações descontroladas que começavam no peito e tentavam subir pela garganta. E o mal estar ia embora quase que instantaneamente. Vários dos encontros foram assim. Até que a presença dela não era mais capaz de dissipar o seu desassossego.
Naqueles dias só podia acender um cigarro, observar o pranto ruidoso dos céus batendo contra sua janela e os carros avançando em meio à enxurrada. E não dava uma sequer tragada no cigarro, segurava-o firmemente entrededos e sobre o cinzeiro, mas perdia-se entrementes; incapaz de consumi-lo, deixava-o consumir-se por si só. Enfim, piscava bruscamente ao sair do transe e observava aquilo que restara: cinzas, e cinzas apenas.
"Você anda fumando demais."
Mas você não entende? Como você não consegue ver? Tudo são cinzas, e o que não era cinza se dissolvia em fumaça.
Naqueles dias só podia acender um cigarro, observar o pranto ruidoso dos céus batendo contra sua janela e os carros avançando em meio à enxurrada. E não dava uma sequer tragada no cigarro, segurava-o firmemente entrededos e sobre o cinzeiro, mas perdia-se entrementes; incapaz de consumi-lo, deixava-o consumir-se por si só. Enfim, piscava bruscamente ao sair do transe e observava aquilo que restara: cinzas, e cinzas apenas.
"Você anda fumando demais."
Mas você não entende? Como você não consegue ver? Tudo são cinzas, e o que não era cinza se dissolvia em fumaça.
da Superfície
À medida em que me ocupo com coisas fúteis, encho-me de vazio até que o vazio é tudo o que me preenche e me constitui. Será o medo de ficar sozinha equivalente ao medo do esquecimento? Todos têm medo, e as pessoas que aparentam ser as mais valentes os têm acumulados, embora suprimidos e ignorados, de modo que alguma ação seja possibilitada. Quanto mais ignoro meus tormentos, mais fortes os sinto. Mas não há o que fazer além de ignorá-los... Ou seja, não há o que fazer.
sábado, 15 de outubro de 2011
Menininha
E porque aquela menina estava sempre chorando?
Ela era fraca e o pior era que não tinha vergonha disso. Desandava aos prantos por aí, na frente de todo mundo, e nem ao menos tinha vergonha disso. Queria sacudí-la, mandá-la acordar para a vida, dar uma bofetada plena em seu rosto para que ela prestasse mais atenção na realidade.
Não imaginara, jamais, que viesse a se tornar aquela garota chorona. Mas pelo menos chorava sozinha.
Nunca pensou que fosse se sentir assim, como uma pequena menininha assustada. Ela era superior a tudo aquilo, sempre fora - eram coisas irrelevantes. Quem dava importância àquilo era fraco. Admitir que se importava seria a mesma coisa que admitir sua própria vulnerabilidade.
Ela era fraca e o pior era que não tinha vergonha disso. Desandava aos prantos por aí, na frente de todo mundo, e nem ao menos tinha vergonha disso. Queria sacudí-la, mandá-la acordar para a vida, dar uma bofetada plena em seu rosto para que ela prestasse mais atenção na realidade.
Não imaginara, jamais, que viesse a se tornar aquela garota chorona. Mas pelo menos chorava sozinha.
Nunca pensou que fosse se sentir assim, como uma pequena menininha assustada. Ela era superior a tudo aquilo, sempre fora - eram coisas irrelevantes. Quem dava importância àquilo era fraco. Admitir que se importava seria a mesma coisa que admitir sua própria vulnerabilidade.
quarta-feira, 28 de setembro de 2011
do Desassossego
"Entrei no barbeiro no modo do costume, com o prazer
de me ser fácil entrar sem constrangimento nas casas conhecidas.
A minha sensibilidade do novo é angustiante: tenho
calma só onde já tenho estado."
"Tenho amor a isto, talvez porque
não tenha mais nada que amar — ou talvez, também, porque
nada valha o amor de uma alma, e, se temos por sentimento
que o dar, tanto vale dá-lo ao pequeno aspecto do meu tinteiro
como à grande indiferença das estrelas."
"Irrita-me a felicidade de todos estes homens que não sabem
que são infelizes. A sua vida humana é cheia de tudo
quanto constituiria uma série de angústias para uma sensibilidade
verdadeira. Mas, como a sua verdadeira vida é vegetativa,
o que sofrem passa por eles sem lhes tocar na alma, e
vivem uma vida que se pode comparar somente a de um homem
com dor de dentes que houvesse recebido uma fortuna
— a fortuna autêntica de estar vivendo sem dar por isso, o
maior dom que os deuses concedem, porque é o dom de lhes
ser semelhante, superior como eles (ainda que de outro
modo) à alegria e à dor."
"Agir, eis a inteligência verdadeira. Serei o que quiser.
Mas tenho que querer o que for. O êxito está em ter êxito, e
não em ter condições de êxito. Condições de palácio tem
qualquer terra larga, mas onde estará o palácio se o não ficarem
ali ?"
Fernando Pessoa
de me ser fácil entrar sem constrangimento nas casas conhecidas.
A minha sensibilidade do novo é angustiante: tenho
calma só onde já tenho estado."
"Tenho amor a isto, talvez porque
não tenha mais nada que amar — ou talvez, também, porque
nada valha o amor de uma alma, e, se temos por sentimento
que o dar, tanto vale dá-lo ao pequeno aspecto do meu tinteiro
como à grande indiferença das estrelas."
"Irrita-me a felicidade de todos estes homens que não sabem
que são infelizes. A sua vida humana é cheia de tudo
quanto constituiria uma série de angústias para uma sensibilidade
verdadeira. Mas, como a sua verdadeira vida é vegetativa,
o que sofrem passa por eles sem lhes tocar na alma, e
vivem uma vida que se pode comparar somente a de um homem
com dor de dentes que houvesse recebido uma fortuna
— a fortuna autêntica de estar vivendo sem dar por isso, o
maior dom que os deuses concedem, porque é o dom de lhes
ser semelhante, superior como eles (ainda que de outro
modo) à alegria e à dor."
"Agir, eis a inteligência verdadeira. Serei o que quiser.
Mas tenho que querer o que for. O êxito está em ter êxito, e
não em ter condições de êxito. Condições de palácio tem
qualquer terra larga, mas onde estará o palácio se o não ficarem
ali ?"
Fernando Pessoa
terça-feira, 27 de setembro de 2011
Menininha
Mas a gente mal se conhece, era o que ela diria, sorrindo sem graça, cética, indiferente. Ia se esquivando de tal maneira das perguntas, dos sentimentos. Sabia que as pessoas você ia conhecendo aos poucos, até o dia em que sentia que as conhecia, então depois viria o dia em que perceberia que nunca os conhecera. O desejo da completude novamente entrava em conflito com a certeza de que ninguém era confiável, mas a solidão era tão, tão insuportável! As pessoas ao redor sorriam, abraçavam, tentavam se aproximar. Ela se sentia sufocada. Ao chegar em casa, contudo, seu coração denunciava a possibilidade de implodir.
A gente mal se conhece, mas eu até gosto de você. Seu sorriso me acalma, sua voz me acalenta - seu abraço não é apenas um substantivo, é um lugar. Com você por perto, todo o resto se desvanece - dentre preocupações e medos -, ficava calma e em paz.
Não sei se te conheço, mas dependia dele de maneiras que desconhecia.
Você não me conhece, eu nunca te conheci, mas não queria ter que viver sem você.
A gente mal se conhece, mas eu até gosto de você. Seu sorriso me acalma, sua voz me acalenta - seu abraço não é apenas um substantivo, é um lugar. Com você por perto, todo o resto se desvanece - dentre preocupações e medos -, ficava calma e em paz.
Não sei se te conheço, mas dependia dele de maneiras que desconhecia.
Você não me conhece, eu nunca te conheci, mas não queria ter que viver sem você.
sexta-feira, 16 de setembro de 2011
Passou muito tempo pensando a respeito do que ia escrever e, por conseguinte, o que ia esquecer. Tinha apenas uma vaga noção, uma superfície de sentimento, uma idéia que se desfigurava a qualquer menção de análise profunda. Ultimamente andava achando tudo que seus amigos diziam meio poético. Ultimamente tinha a impressão de que sentia a dor alcançar profundezas que nem devia possuir - o âmago, as entranhas, os recônditos do ser.
Queria começar assim: estou começando a achar que você é só uma idéia minha, coisa da minha cabeça. Desfigurada, disforme, envolta pela névoa, intocável. Apagou o que tinha escrito um pouco depois - todas as pessoas eram apenas idéias que se fazia delas, aquela era uma regra e não a exceção.
Ultimamente andava achando tudo que seus amigos diziam meio poético. "Você me constrói e eu te destruo".
Queria começar assim: estou começando a achar que você é só uma idéia minha, coisa da minha cabeça. Desfigurada, disforme, envolta pela névoa, intocável. Apagou o que tinha escrito um pouco depois - todas as pessoas eram apenas idéias que se fazia delas, aquela era uma regra e não a exceção.
Ultimamente andava achando tudo que seus amigos diziam meio poético. "Você me constrói e eu te destruo".
Sonho
Ela revelou meio sem jeito que estava com muito sono, que teria de ir embora. Ele apenas assentiu, dividido entre a compreensão e a decepção. Ela revelou timidamente que vivia com sono agora, não sabia o porquê (se é que havia uma explicação). Não obstante, ele quis saber o porquê. Ela deu de ombros, balançou a cabeça, brincou com uma mecha no cabelo, estalou alguns dedos... Não sabia bem o porquê. Fitava as unhas pintadas que estavam um pouco descascadas enquanto confessava que talvez estivesse doente, talvez estivesse deprimida. Sabia que depressão era uma coisa séria, então não era uma depressão de verdade, talvez só estivesse "meio deprê". Às vezes você só tá precisando sonhar mais, disse ele simplesmente.
Asa de borboleta
Seriam mesmo as coisas mais tristes as mais bonitas? A felicidade já foi acusada de ser rasa, efêmera e passageira. Mas não estaria justamente aí a sua beleza inerente? Pobre réu indefesa: era acusada devido à incapacidade de seus promotores de injustiça, incapazes que eram de capturar aquela própria essência tênue que a caracterizava, de saboreá-la em seu próprio aspecto frágil e quebradiço - queriam agarrá-la com garras afiadas e, num intuito egoísta, aprisioná-la. E a felicidade, leve e esvoaçante feito borboleta, se não escapa-nos por entre os dedos enquanto nos atrapalhamos com tentativas frutradas de capturá-la, tem suas frágeis asas quebradas na brutalidade e na incompreensão.
-Você já reparou na asa de uma borboleta? - ele perguntou.
Ela não sabia muito bem onde ele queria chegar, então apenas assentiu com a cabeça. Era provável que sim, todo mundo já tinha visto uma asa de borboleta, mas ela não sabia ao certo se havia notado aquele detalhe ao qual ele fazia referência.
-Primeiro que as cores mais bonitas estão sempre dentro da asa, não do lado de fora. Então você tem que olhar para uma borboleta parada para realmente admirá-la. O problema é que elas estão sempre esvoaçantes, inquietas. Ao sinal de qualquer movimento, já voam para longe. Depois, tem o fato de que suas asas são muito frágeis. Dizem que se você tocar, há grandes chances que elas se despedacem... Ah! Sem contar que o tempo de vida delas é tão curto, e boa parte dele elas passam rastejando com o corpo murcho e as asas encolhidas...
Ela sorriu de uma maneira discreta e triste.
-Acho que eu entendi o que você quis dizer.
-Você já reparou na asa de uma borboleta? - ele perguntou.
Ela não sabia muito bem onde ele queria chegar, então apenas assentiu com a cabeça. Era provável que sim, todo mundo já tinha visto uma asa de borboleta, mas ela não sabia ao certo se havia notado aquele detalhe ao qual ele fazia referência.
-Primeiro que as cores mais bonitas estão sempre dentro da asa, não do lado de fora. Então você tem que olhar para uma borboleta parada para realmente admirá-la. O problema é que elas estão sempre esvoaçantes, inquietas. Ao sinal de qualquer movimento, já voam para longe. Depois, tem o fato de que suas asas são muito frágeis. Dizem que se você tocar, há grandes chances que elas se despedacem... Ah! Sem contar que o tempo de vida delas é tão curto, e boa parte dele elas passam rastejando com o corpo murcho e as asas encolhidas...
Ela sorriu de uma maneira discreta e triste.
-Acho que eu entendi o que você quis dizer.
segunda-feira, 12 de setembro de 2011
O Espanto
Ela estava apenas deitada ali na cama dele e, com a mente vazia, limitava-se a observar. Estava inerte, a cabeça repousando sobre o travesseiro e o corpo no colchão macio. Além disso, sua mente repousava inerte no assombro. Antes de ele ter entrado no quarto, ela estava num estado semi-adormecido, mas agora, embora não estivesse mais prestes a cair no sono, não parecia ter acordado. Sentia-se como em outra espécie de inconsciência, como se estivesse em transe. Apenas observando, examinou-o enquanto colocava suas roupas, peça a peça, e como ele parecia alheio a ela - ao que estava pensando, sentindo e em como encontrava-se mesmerizada naquele momento. Ele limitava-se a lançar olhares breves e relanceados na direção dos olhos dela, que retribuíam opacos, analíticos. Estava perplexa com a seriedade dele, que aumentava a cada peça de roupa que ele acrescentava - crescendo cada vez mais a cada botão da camisa que era abotoado, à medida em que dava o nó em sua gravata e, principalmente, a cada olhar vazio que era relanceado. Ela não fazia idéia do que possivelmente estava passando pela cabeça dele naquele momento, tampouco se atentou para o fato de que provavelmente a recíproca era verdadeira. Enquanto cada gesto dele (e também os gestos que se ausentaram: a falta de um sorriso, um beijo ou uma franzida de cenho sequer) era incompreensível e indecifrável para ela - que apenas observava com assombro - para ele, o silêncio dela também o era. Para ela, contudo, era desprovido de significado que não fosse o do simples deslumbramento com o outro. Já havia percebido que a cada dia que passava ele ficava mais bonito aos seus olhos. Ficava também mais distante, mas era difícil dividir as culpas por dois e saber de quem era a maior parcela. Talvez porque fosse uma operação matemática inexata; ela não sabia, nunca fora muito boa com a matemática - e nem com relações humanas. E à medida que a distância aumentava entre os dois (ele estava ali, bem ali na sua frente e, ao mesmo tempo, nunca esteve mais longe), ela percebia que naquele vão cabiam todas as coisas que desconhecia a respeito dele. Até tomar consciência de que era um abismo infinito - e que não o conhecia em absoluto.
Não sei quando perdi o meu lugar na sua vida (se é que um dia já o tive), mas penso que foi em meio a um processo no qual você ganhava cada vez mais espaço na minha. Abrir mão de você me foi custoso, mas o fiz mesmo assim pois sabia o quão patético e vão seria fechar as mãos, fechar os olhos; agarrar-me a uma ilusão na qual eu sequer era capaz de acreditar. Ah, e como desejei me iludir! Não estaria eu sendo inflexível, intransigente, impaciente, imatura?
E hoje em dia sou eternamente grata à minha intransigência.
E hoje em dia sou eternamente grata à minha intransigência.
domingo, 21 de agosto de 2011
Bons modos.
Onde estão meus modos, se é que já os tive?
Peço desculpas ao homem que em mim esbarra e quase me derruba, peço desculpas ao me exaltar em alguma discussão e acabo cedendo ao desejo de outros - demoro-me com os dedos hesitantes sobre as teclas do telefone e em seguida peço desculpas por te incomodar.
A boa educação matou os instintos.
Peço desculpas ao homem que em mim esbarra e quase me derruba, peço desculpas ao me exaltar em alguma discussão e acabo cedendo ao desejo de outros - demoro-me com os dedos hesitantes sobre as teclas do telefone e em seguida peço desculpas por te incomodar.
A boa educação matou os instintos.
domingo, 14 de agosto de 2011
Não consigo lamentar sua perda mais do que lamento a solidão. Mas agora sei que sempre estive só. O que nos deixa alterados é a esperança de que chegue o fim da solidão, enquanto o que nos consome é a certeza de que este só chega com outro fim último: a morte.
Queria poder parar o amanhã de acontecer. (Parar de) Acordar na mesmice. As horas finais de um dia são sempre as mais satisfatórias e as mais angustiantes. O finalismo de tudo que emociona, mas o recomeçar mais uma vez trazido pelo dia seguinte mata. Morrendo cada vez mais, cada dia mais.
A esperança é uma doença. A falta dela é a própria morte.
Acordar para mais um dia em que sinto falta. Em que luto em vão contra minhas (des)ilusões e (des)esperanças.
Meus sentimentos só morrerão no dia em que acabar esse tipo de espera otimista. E a espera nunca acaba porque insisto em me agarrar à esses sentimentos inúteis, suprimidos internamente, sufocados na garganta, ignorados por mim e por ti.
Pensei ter te visto nos mais diversos lugares hoje. Tentei me convencer que era só minha miopia se manifestando, mas eu sabia que também era saudade.
Queria poder parar o amanhã de acontecer. (Parar de) Acordar na mesmice. As horas finais de um dia são sempre as mais satisfatórias e as mais angustiantes. O finalismo de tudo que emociona, mas o recomeçar mais uma vez trazido pelo dia seguinte mata. Morrendo cada vez mais, cada dia mais.
A esperança é uma doença. A falta dela é a própria morte.
Acordar para mais um dia em que sinto falta. Em que luto em vão contra minhas (des)ilusões e (des)esperanças.
Meus sentimentos só morrerão no dia em que acabar esse tipo de espera otimista. E a espera nunca acaba porque insisto em me agarrar à esses sentimentos inúteis, suprimidos internamente, sufocados na garganta, ignorados por mim e por ti.
Pensei ter te visto nos mais diversos lugares hoje. Tentei me convencer que era só minha miopia se manifestando, mas eu sabia que também era saudade.
domingo, 7 de agosto de 2011
Guimarães Rosa
"Ah, mas falo falso. O senhor sente? Desmente? Eu
desminto. Contar é muito, muito dificultoso. Não pelos anos que
se já passaram. Mas pela astúcia que têm certas coisas passadas –
de fazer balancê, de se remexerem dos lugares. O que eu falei foi
exato? Foi. Mas teria sido? Agora, acho que nem não. São tantas horas de pessoas, tantas coisas em tantos tempos, tudo miúdo
recruzado. Se eu fosse filho de mais ação, e menos idéia, isso sim,
tinha escapulido, calado, no estar da noite, varava dez léguas,
madrugada, me escondia do largo do sol, varava mais dez,
passava o São Felipe, as serras, as Vinte-e-Uma-Lagoas,
encostava no São Francisco bem de frente da Januária, passava,
chegava em terra cidadã, estava no pique. [...] Mas
eu fui sempre um fugidor. Ao que fugi até da precisão de fuga.
As razões de não ser. O que foi que eu pensei? Nas
terríveis dificuldades; certamente, meiamente. Como ia poder
me distanciar dali, daquele ermo jaibão, em enormes voltas e
caminhadas, aventurando, aventurando? Acho que eu não tinha
conciso medo dos perigos: o que eu descosturava era medo de
errar – de ir cair na boca dos perigos por minha culpa. Hoje, sei:
medo meditado – foi isto. Medo de errar. Sempre tive. Medo de errar é que é a minha paciência. [...]
Acho que o espírito da gente é cavalo que escolhe
estrada: quando ruma para tristeza e morte, vai não vendo o que
é bonito e bom. [...]
Contar seguido, alinhavado, só mesmo sendo as coisas de rasa
importância. De cada vivimento que eu real tive, de alegria forte
ou pesar, cada vez daquela hoje vejo que eu era como se fosse
diferente pessoa. Sucedido desgovernado. Assim eu acho, assim é
que eu conto. O senhor é bondoso de me ouvir. Tem horas antigas que ficaram muito mais perto da gente do que outras, de
recente data. [...]
Toda saudade é uma espécie de velhice."
desminto. Contar é muito, muito dificultoso. Não pelos anos que
se já passaram. Mas pela astúcia que têm certas coisas passadas –
de fazer balancê, de se remexerem dos lugares. O que eu falei foi
exato? Foi. Mas teria sido? Agora, acho que nem não. São tantas horas de pessoas, tantas coisas em tantos tempos, tudo miúdo
recruzado. Se eu fosse filho de mais ação, e menos idéia, isso sim,
tinha escapulido, calado, no estar da noite, varava dez léguas,
madrugada, me escondia do largo do sol, varava mais dez,
passava o São Felipe, as serras, as Vinte-e-Uma-Lagoas,
encostava no São Francisco bem de frente da Januária, passava,
chegava em terra cidadã, estava no pique. [...] Mas
eu fui sempre um fugidor. Ao que fugi até da precisão de fuga.
As razões de não ser. O que foi que eu pensei? Nas
terríveis dificuldades; certamente, meiamente. Como ia poder
me distanciar dali, daquele ermo jaibão, em enormes voltas e
caminhadas, aventurando, aventurando? Acho que eu não tinha
conciso medo dos perigos: o que eu descosturava era medo de
errar – de ir cair na boca dos perigos por minha culpa. Hoje, sei:
medo meditado – foi isto. Medo de errar. Sempre tive. Medo de errar é que é a minha paciência. [...]
Acho que o espírito da gente é cavalo que escolhe
estrada: quando ruma para tristeza e morte, vai não vendo o que
é bonito e bom. [...]
Contar seguido, alinhavado, só mesmo sendo as coisas de rasa
importância. De cada vivimento que eu real tive, de alegria forte
ou pesar, cada vez daquela hoje vejo que eu era como se fosse
diferente pessoa. Sucedido desgovernado. Assim eu acho, assim é
que eu conto. O senhor é bondoso de me ouvir. Tem horas antigas que ficaram muito mais perto da gente do que outras, de
recente data. [...]
Toda saudade é uma espécie de velhice."
sexta-feira, 5 de agosto de 2011
-Eu queria conversar.
Ela tinha tanta coisa para lhe falar, mas não sabia nem por onde começar, tampouco quão longe deveria ir. Ele responde do outro lado da linha, sem suspiros e sem hesitação:
-Claro, passa aqui.
Sua voz é firme e tranquila. Ela sente que dessa vez será capaz de dizer pelo menos alguma coisa. Respira fundo.
-Tá bom.
Os minutos se arrastam enquanto ela dá voltas na cadeira giratória, os olhos fixando-se a cada segundo em um objeto diferente do quarto, incapaz de fixar o seu olhar no dele.
-Não sei porque é tão difícil.
Ele se aproxima, os olhos dela se fixam nos dele agora.
-Não tem problema.
E a medida que os braços dele a envolvem, ela sabe que não será capaz de dizer mais nada. Enquanto estivesse ali, não tinha problema.
-Tudo bem, vai ficar tudo bem.
Ela tinha tanta coisa para lhe falar, mas não sabia nem por onde começar, tampouco quão longe deveria ir. Ele responde do outro lado da linha, sem suspiros e sem hesitação:
-Claro, passa aqui.
Sua voz é firme e tranquila. Ela sente que dessa vez será capaz de dizer pelo menos alguma coisa. Respira fundo.
-Tá bom.
Os minutos se arrastam enquanto ela dá voltas na cadeira giratória, os olhos fixando-se a cada segundo em um objeto diferente do quarto, incapaz de fixar o seu olhar no dele.
-Não sei porque é tão difícil.
Ele se aproxima, os olhos dela se fixam nos dele agora.
-Não tem problema.
E a medida que os braços dele a envolvem, ela sabe que não será capaz de dizer mais nada. Enquanto estivesse ali, não tinha problema.
-Tudo bem, vai ficar tudo bem.
domingo, 31 de julho de 2011
Solidão & Silêncio
Sempre agarrada firmemente ao corrimão, nunca soube como se soltar. A segurança era agradável, enquanto sua vista se estremecia com um simples relance de uma queda livre.
Qual era o sentido de se atirar, e porque as pessoas faziam isso? A queda podia ser libertadora, mas compensava o impacto de atingir o chão duro e frio?
Mas mesmo assim sentia frio. O aperto firme que envolvia as grades cilíndricas começava a se afrouxar. Pra que segurar com tanto afinco? A esperança de que sua mente fosse preenchida apenas por vazio, que o vácuo adentrasse por seus ouvidos, boca e nariz e preenchesse sua cabeça com o nada a impelia a se soltar.
As vozes continuavam, vindas de todas as direções, gritos e sussurros, apelos, súplicas, réplicas, tréplicas. Havia se esquecido qual era o som do silêncio. A visão do abismo tornava-se ainda mais tentadora. Solidão & Silêncio.
Sabia ser impossível ser livre enquanto ainda estivesse presa. Contudo, seria a liberdade realmente desejável a medida que era necessário que fosse capaz de se atirar, sem ao menos pensar? Era, então, impossível ser livre enquanto ainda estivesse pensando.
Não percebeu quando o aperto afrouxou-se tanto de maneira a ser vencido pela gravidade. A sensação da queda era indescritível. Como não houve pensamento, não havia palavras. O coração não pulsava mais em sua gaiola torácica, pois a pulsação agora se dava em todos os lugares. A pulsação subjugara a corrente elétrica neuronal, os instintos venciam a mente.
Só que durou por apenas uma fração de segundo. Brevíssimo. O chão era concreto, duro e frio, de fato. De fato, a sensação passara e só sobravam os fatos. Havia também a dor. E essa não pulsava, pois era pontiaguda e profunda.
Juntar os cacos parecia impraticável. E qual seria o objetivo? Içar-se, patética e trêmula, para agarrar-se, assustada e retraída, à grade firme? A liberdade viria tentá-la novamente. Porém, a perspectiva de soltar-se novamente era terrível. Arriscar-se não valia a pena.
Qual era o sentido de se atirar, e porque as pessoas faziam isso? A queda podia ser libertadora, mas compensava o impacto de atingir o chão duro e frio?
Mas mesmo assim sentia frio. O aperto firme que envolvia as grades cilíndricas começava a se afrouxar. Pra que segurar com tanto afinco? A esperança de que sua mente fosse preenchida apenas por vazio, que o vácuo adentrasse por seus ouvidos, boca e nariz e preenchesse sua cabeça com o nada a impelia a se soltar.
As vozes continuavam, vindas de todas as direções, gritos e sussurros, apelos, súplicas, réplicas, tréplicas. Havia se esquecido qual era o som do silêncio. A visão do abismo tornava-se ainda mais tentadora. Solidão & Silêncio.
Sabia ser impossível ser livre enquanto ainda estivesse presa. Contudo, seria a liberdade realmente desejável a medida que era necessário que fosse capaz de se atirar, sem ao menos pensar? Era, então, impossível ser livre enquanto ainda estivesse pensando.
Não percebeu quando o aperto afrouxou-se tanto de maneira a ser vencido pela gravidade. A sensação da queda era indescritível. Como não houve pensamento, não havia palavras. O coração não pulsava mais em sua gaiola torácica, pois a pulsação agora se dava em todos os lugares. A pulsação subjugara a corrente elétrica neuronal, os instintos venciam a mente.
Só que durou por apenas uma fração de segundo. Brevíssimo. O chão era concreto, duro e frio, de fato. De fato, a sensação passara e só sobravam os fatos. Havia também a dor. E essa não pulsava, pois era pontiaguda e profunda.
Juntar os cacos parecia impraticável. E qual seria o objetivo? Içar-se, patética e trêmula, para agarrar-se, assustada e retraída, à grade firme? A liberdade viria tentá-la novamente. Porém, a perspectiva de soltar-se novamente era terrível. Arriscar-se não valia a pena.
sábado, 23 de julho de 2011
Ah, que saudades de mim mesma! A nostalgia que sinto é por tempos em que era eu mesma sem pensar duas vezes, sem ser influenciada. Cercada de estranhos, sou conduzida a caminhos obscuros, envolvida em delírios de terceiros. Então anseio pelo retorno de uma capacidade de pensamento independente, de sentimentos puros - e vejo que só serei capaz de alcançá-los através do isolamento. Quando me bate a solidão, percebo que sou inábil por não conseguir suportá-la. Surge a necessidade do envolvimento com pessoas, volta a confusão. Quem é mais insuportável: a Solidão ou Eu?
Não ando gostando de mim ultimamente.
Que saudades de alguém que nunca fui!
Penso duas vezes e vejo que não tenho a quem culpar.
What a mess!
Não ando gostando de mim ultimamente.
Que saudades de alguém que nunca fui!
Penso duas vezes e vejo que não tenho a quem culpar.
What a mess!
quinta-feira, 23 de junho de 2011
Vazio
Nunca pensou que fosse se colocar nessa posição. O que sempre soube de si mesma foi que enquanto sentisse subjetividade pulsando, seu sofrimento apertando, estava viva. Enquanto era mais alma do que corpo, ainda era ela mesma. Mas ultimamente parecia ter trocado de pele, adotado o cinismo e a esterilidade em suas relações sociais, pessoais, amorosas. Ao racionalizar as coisas ao extremo, podia ver com clareza. Era, contudo, incapaz de sentir.
quarta-feira, 22 de junho de 2011
In disponibilidade
Sei que tenho que te deixar sentir minha falta, mas não quero sentir sua falta no processo. Você, que agora caminha calmamente em minha direção, não sabe o que a ânsia desse reencontro desencadeou em mim.
Aparentemente, prefiro viver na incerteza e na inquietação. O sossego não só é inalcançável como também é indesejável. Sigo dançando os passos descompassados do nosso jazz de compasso quebrado, as quatro estações da calma sinfonia confundindo-se em somente um estado de espírito inconstante e alterado.
Prefiro? A preferência infere a existência de uma escolha, e creio que esse não é bem o caso - pois se trata mais de uma condição.
A indisponibilidade tende a atrair àqueles que não gostam de se colocar à disposição.
Você não tem que ficar sozinho. Mas você quer ficar sozinho.
Aparentemente, prefiro viver na incerteza e na inquietação. O sossego não só é inalcançável como também é indesejável. Sigo dançando os passos descompassados do nosso jazz de compasso quebrado, as quatro estações da calma sinfonia confundindo-se em somente um estado de espírito inconstante e alterado.
Prefiro? A preferência infere a existência de uma escolha, e creio que esse não é bem o caso - pois se trata mais de uma condição.
A indisponibilidade tende a atrair àqueles que não gostam de se colocar à disposição.
Você não tem que ficar sozinho. Mas você quer ficar sozinho.
-É que às vezes eu me sinto triste sem motivo.
-Talvez você tenha muitos motivos e não sabe qual te afeta mais no momento.
-Sei que as coisas não costumam me afetar quando eu estou com as pessoas que eu gosto. Eu me sinto feliz. Mas quando eu fico sozinha, eu fico triste... Também não gosto de me sentir sozinha, apesar de ter consciência de minha solitude... O problema é quando eu a sinto.
-Mas você sabe o que você pode fazer quando você estiver se sentindo sozinha?
-O que? Imagino que nada...
-Você pode me falar.
-Hm.
-Você me fala quando você estiver se sentindo sozinha, aí eu saio com você e nós não vamos mais estar sozinhas e tristes.
-Talvez você tenha muitos motivos e não sabe qual te afeta mais no momento.
-Sei que as coisas não costumam me afetar quando eu estou com as pessoas que eu gosto. Eu me sinto feliz. Mas quando eu fico sozinha, eu fico triste... Também não gosto de me sentir sozinha, apesar de ter consciência de minha solitude... O problema é quando eu a sinto.
-Mas você sabe o que você pode fazer quando você estiver se sentindo sozinha?
-O que? Imagino que nada...
-Você pode me falar.
-Hm.
-Você me fala quando você estiver se sentindo sozinha, aí eu saio com você e nós não vamos mais estar sozinhas e tristes.
domingo, 12 de junho de 2011
Feliz dia dos namorados!/Paradoxo
Ela viajava no movimento mini-ciclônico da xícara de café dele. Sobressaltou-se com o tilintar da colher no pratinho.
-Tudo bem, eu consigo lidar com essas coisas tranquilamente. Não estou mandando presente pra mim mesmo - ele soava, de fato, tranquilo e indiferente, enquanto bebericava seu café, que não era, de fato, café, mas sim chai latte.
Ela deu de ombros.
-Vou soar como se me importasse, mas eu realmente sou indiferente.
Ele franziu o cenho.
-Não sei... Sei lá. - suspirou e deu uma golada no chai que tinha gosto de café. - Eu sinto falta. De ter alguém, sabe.
Ela observava os passantes, em particular duas meninas com trajes de festa junina. Analisou as peças de roupa com particular interesse, e depois voltou-se para ele.
-Meio paradoxal hein? - comentou com um sorrisinho. - Sentir falta de algo que você nunca teve.
Ele deu de ombros e esboçou um sorriso.
-Eu só acho que seria bom.
E quando a xícara de chai e o assunto se esgotaram, eles se levantaram. Ela tomou o braço dele para si ao sentir o vento frio e foram em direção ao carro.
-Feliz dia dos namorados! - disse a garçonete, de dentro da cafeteria.
Eles se entreolharam e começaram a gargalhar. Ao fecharem as portas do carro, continuavam rindo.
Tinham um ao outro, embora não inteiramente. Havia uma certa limitação naquele relacionamento. Ela era quem estava, de fato, tranquila, embora fosse apenas momentaneamente - compreendia muito bem como era aquele vazio que o consumia por dentro. Lembrou-se do movimento minimamente ciclônico. Também era capaz de compreendê-lo - era capaz de senti-lo.
Entendia melhor de paradoxos do que hipérboles, oxímoros, metonímias. Seu riso, inclusive, fora paradoxal. Seu choro, aliás, também o era. Lembrou-se do dia em que chorou por ser incapaz de traduzir em gestos aquilo que compreendia com o coração.
-Tudo bem, eu consigo lidar com essas coisas tranquilamente. Não estou mandando presente pra mim mesmo - ele soava, de fato, tranquilo e indiferente, enquanto bebericava seu café, que não era, de fato, café, mas sim chai latte.
Ela deu de ombros.
-Vou soar como se me importasse, mas eu realmente sou indiferente.
Ele franziu o cenho.
-Não sei... Sei lá. - suspirou e deu uma golada no chai que tinha gosto de café. - Eu sinto falta. De ter alguém, sabe.
Ela observava os passantes, em particular duas meninas com trajes de festa junina. Analisou as peças de roupa com particular interesse, e depois voltou-se para ele.
-Meio paradoxal hein? - comentou com um sorrisinho. - Sentir falta de algo que você nunca teve.
Ele deu de ombros e esboçou um sorriso.
-Eu só acho que seria bom.
E quando a xícara de chai e o assunto se esgotaram, eles se levantaram. Ela tomou o braço dele para si ao sentir o vento frio e foram em direção ao carro.
-Feliz dia dos namorados! - disse a garçonete, de dentro da cafeteria.
Eles se entreolharam e começaram a gargalhar. Ao fecharem as portas do carro, continuavam rindo.
Tinham um ao outro, embora não inteiramente. Havia uma certa limitação naquele relacionamento. Ela era quem estava, de fato, tranquila, embora fosse apenas momentaneamente - compreendia muito bem como era aquele vazio que o consumia por dentro. Lembrou-se do movimento minimamente ciclônico. Também era capaz de compreendê-lo - era capaz de senti-lo.
Entendia melhor de paradoxos do que hipérboles, oxímoros, metonímias. Seu riso, inclusive, fora paradoxal. Seu choro, aliás, também o era. Lembrou-se do dia em que chorou por ser incapaz de traduzir em gestos aquilo que compreendia com o coração.
Conhecer
E por vezes me pergunto o que há em mim e que te sustenta. Você, que conhece tantos lugares e pessoas e que decidiu fazer uma parada na mesma estação que eu, pequena, ignorante aos fatos e lugares. Você de multidões, tão alto e maior, enquanto eu em meu canto fico absorta em introspecção, sem saber de nada. Eu que nunca vi metade do que você viu, conheci de ti, medos e segredos, confissões entrecortadas por suspiros e úmidas de lágrimas que nunca chegaram a tomar forma. E então vejo onde estamos em sintonia; não quando faço o que você faz, mas quando sinto o que sente, quando através de minhas palavras e de minhas mãos te ofereço conforto, algo que você desconhecia. Encontramo-nos então do mesmo tamanho, apesar de não saber do que você sabe - conheci o que até então lhe era desconhecido, pois agora sei de ti.
segunda-feira, 6 de junho de 2011
Wishful Thinking
E então encontramo-nos sós sob o céu estrelado. Em meio ao silêncio que nos permeia, nossas mãos se roçam e nossos pensamentos se encontram. Ou será que é tudo minha imaginação? Wishful Thinking.
Eu te digo que você é essencial em minha vida, mas o único modo de dizer algo tão sério é através de um tom jocoso - que automaticamente prejudica minha sincera constatação.
Eu te digo que você é essencial em minha vida, mas o único modo de dizer algo tão sério é através de um tom jocoso - que automaticamente prejudica minha sincera constatação.
terça-feira, 31 de maio de 2011
Falta de palavras
Quando submeto o sentimento à reflexão, não permanece ele puro e autêntico. Submete-se ele também ao jugo da mente; autoritária e com pretensões absolutas em sua racionalidade e, por isso, insincera.
E faltam-me palavras para descrever o que sinto. Porque não sei se de fato sinto ou se apenas imagino. Se crio a partir da minha cabeça - da imaginação - é porque está alheio o coração? O que escrevo não é o que sinto. Sempre desejo transcrever algo percebido em determinado momento, mas no instante seguinte já não sei mais descrevê-lo. O que escrevo é uma farsa, o esforço de retorno a algo que já não mais subsiste. A culpa é de minha inconstância ou da minha incapacidade? Talvez seja de ambas, ou de nenhuma. As palavras, ambíguas, abstratas, me fogem novamente. E, exausto, dolorido, balbucia o coração. Mas, como sempre o fui, sou incapaz de compreendê-lo.
E faltam-me palavras para descrever o que sinto. Porque não sei se de fato sinto ou se apenas imagino. Se crio a partir da minha cabeça - da imaginação - é porque está alheio o coração? O que escrevo não é o que sinto. Sempre desejo transcrever algo percebido em determinado momento, mas no instante seguinte já não sei mais descrevê-lo. O que escrevo é uma farsa, o esforço de retorno a algo que já não mais subsiste. A culpa é de minha inconstância ou da minha incapacidade? Talvez seja de ambas, ou de nenhuma. As palavras, ambíguas, abstratas, me fogem novamente. E, exausto, dolorido, balbucia o coração. Mas, como sempre o fui, sou incapaz de compreendê-lo.
domingo, 29 de maio de 2011
quinta-feira, 21 de abril de 2011
Nem de direita, nem de esquerda
Na verdade sou pra baixo. A maioria das disputas e discussões de impacto em voga no mundo são, ao meu ver, inúteis. Abstenho-me de paixões cegas de objetivo vazio. Não porque eu seja imune à paixão - duvido que um ser humano com tal constituição exista. Ah, e uma preguiça mental me toma, então sou forçada a adiantar minha conclusão:
Que por você eu disputaria - sem discussões.
Que por você eu disputaria - sem discussões.
terça-feira, 19 de abril de 2011
Estilhaços
Se estilhaçar-me em incontáveis pedaços ajudasse a aliviar a sua dor, eu não hesitaria. Mas eu sempre soube que não poderia te salvar. Em meio a confusão de odores e corpos, acabei emaranhada em seu olhar e deixei que a Esperança me ludibriasse por alguns instantes. Quando retomei a consciência, percebi que apenas em meus devaneios nós dois não estávamos infelizes. Sentia a presença do seu olhar sempre presente em minhas costas, apesar de permanecer incapaz de detectar seus esforços mudos de me alcançar. Todas as vezes que eu ousava olhar para trás, seu olhar não estava mais lá para me encontrar. De quem seria a culpa? Minha, sua ou do descompasso?
Não era eu, o problema não era eu. Mas ainda assim a dúvida instigava a inquietação. Virei-me e tentei seguir o rastro do seu desespero, conseguindo me encontrar apenas com a sua sombra.
Eu estava em pedaços e você não tinha salvação.
Não era eu, o problema não era eu. Mas ainda assim a dúvida instigava a inquietação. Virei-me e tentei seguir o rastro do seu desespero, conseguindo me encontrar apenas com a sua sombra.
Eu estava em pedaços e você não tinha salvação.
Sentir, sentir e não agir
O problema é sempre sentir demais e agir de menos. Mas se não ajo é de modo a não prolongar sentimentos como a angústia, sensações como a taquicardia. Não nasci para noites insones e, ainda assim, morro um pouco mais dentro da escuridão sombria a cada dia que passa. Talvez minha única dor seja a de nunca ter sentido uma dor real, enquanto fui capaz de perceber a dor presente nos olhares mortos, nos sorrisos enferrujados e até mesmo nas almas rasas, as mais dolorosas para aqueles que com elas entram em contato, pois não conseguem se expandir e se aprofundar devido as limitações de um corpo.
A dor que sinto, ao perceber que apesar de tudo você ainda sorri, só aumenta.
Eu sempre soube que você era incapaz de me compreender, pois percebi que você não buscava pelo sofrimento. Como todas as pessoas saudáveis, você só queria ser feliz. Enquanto isso, ignorando todas as evidências da minha insanidade, eu queria entender das tormentas, do terror, da angústia, do pesar. Eu tentava compreender mesmo estando ciente que não havia nada de errado com a minha vida. Nada de muito grave. Ninguém havia morrido, ninguém passava fome, tudo em meu corpo estava inteiro e no mais perfeito funcionamento. Contudo, eu sabia que algo estava em pedaços, que algo estava muito errado.
Você nunca entenderia e eu não sei até que ponto você tentou. O fato é que é melhor que você não sinta o que eu sinto, mesmo que isso resulte nesse crescente abismo que se encontra entre nós. Mesmo que isso signifique que eu vou continuar sozinha.
Por vezes, tive esperanças de que você conseguisse me contagiar com a sua saúde. No entanto, soube que devia me afastar para evitar que você se contaminasse com a minha doença.
Eu não havia experienciado o verdadeiro sofrimento, nada estava errado e eu continuava me encontrando, ao procurar meu lugar dentro deste mundo hostil, em meio à solidão. Quanto à minha busca, optei por procurar pela dor já que esta sempre me pareceu mais alcançável do que a felicidade - uma noção para mim um tanto quanto abstrata e intangível.
Enquanto procurava aquilo que sempre está em sobra no mundo, muito embora estivesse em falta no meu mundo, distanciei-me cada vez mais da felicidade e arrastei, inconscientemente, as pessoas ao meu redor junto comigo.
Pensei muitas vezes em me desviar para o caminho da auto-destruição. Mas eu sabia que, não importava o quanto eu tentasse encontrar aquilo que eu ainda não sabia o que era, se montasse uma escala entre a alegria e o pesar e escolhesse qualquer uma das variações, meu interior continuaria vazio, meu peito restaria inerte. E no fundo eu já sabia qual era o meu verdadeiro problema.
Eu não sentia nada.
A dor que sinto, ao perceber que apesar de tudo você ainda sorri, só aumenta.
Eu sempre soube que você era incapaz de me compreender, pois percebi que você não buscava pelo sofrimento. Como todas as pessoas saudáveis, você só queria ser feliz. Enquanto isso, ignorando todas as evidências da minha insanidade, eu queria entender das tormentas, do terror, da angústia, do pesar. Eu tentava compreender mesmo estando ciente que não havia nada de errado com a minha vida. Nada de muito grave. Ninguém havia morrido, ninguém passava fome, tudo em meu corpo estava inteiro e no mais perfeito funcionamento. Contudo, eu sabia que algo estava em pedaços, que algo estava muito errado.
Você nunca entenderia e eu não sei até que ponto você tentou. O fato é que é melhor que você não sinta o que eu sinto, mesmo que isso resulte nesse crescente abismo que se encontra entre nós. Mesmo que isso signifique que eu vou continuar sozinha.
Por vezes, tive esperanças de que você conseguisse me contagiar com a sua saúde. No entanto, soube que devia me afastar para evitar que você se contaminasse com a minha doença.
Eu não havia experienciado o verdadeiro sofrimento, nada estava errado e eu continuava me encontrando, ao procurar meu lugar dentro deste mundo hostil, em meio à solidão. Quanto à minha busca, optei por procurar pela dor já que esta sempre me pareceu mais alcançável do que a felicidade - uma noção para mim um tanto quanto abstrata e intangível.
Enquanto procurava aquilo que sempre está em sobra no mundo, muito embora estivesse em falta no meu mundo, distanciei-me cada vez mais da felicidade e arrastei, inconscientemente, as pessoas ao meu redor junto comigo.
Pensei muitas vezes em me desviar para o caminho da auto-destruição. Mas eu sabia que, não importava o quanto eu tentasse encontrar aquilo que eu ainda não sabia o que era, se montasse uma escala entre a alegria e o pesar e escolhesse qualquer uma das variações, meu interior continuaria vazio, meu peito restaria inerte. E no fundo eu já sabia qual era o meu verdadeiro problema.
Eu não sentia nada.
quarta-feira, 13 de abril de 2011
E as ilusões?
The more you grow, the less you mature
You'll become more aware
Of the things that you have to endure
You'll never get what you want
You'll never know what you really need
Stick to the faded dream of the golden years
you were supposed to have
I'll never get what I want
But at least I have my illusions
You'll become more aware
Of the things that you have to endure
You'll never get what you want
You'll never know what you really need
Stick to the faded dream of the golden years
you were supposed to have
I'll never get what I want
But at least I have my illusions
Devaneio sobre um sonho
O que separa o sonho bom do ruim?
Um é o que queremos ser, o outro representa o que tememos?
Qual deles nunca vai acontecer? Será que algum deles há de se concretizar?
Quando vamos parar de tentar capturar com nossas mãos uma felicidade fluída que nos escorre por entre os dedos?
Ao invés de sonhares com castelos de areia, deves começar a empilhar tijolos.
Um é o que queremos ser, o outro representa o que tememos?
Qual deles nunca vai acontecer? Será que algum deles há de se concretizar?
Quando vamos parar de tentar capturar com nossas mãos uma felicidade fluída que nos escorre por entre os dedos?
Ao invés de sonhares com castelos de areia, deves começar a empilhar tijolos.
E o Futuro do Pretérito?
Cai a noite e tudo adormece, menos as inquietações do meu âmago febril. Sei que não penso mais em você, mas ainda assim meu subconsciente insiste em me enganar utilizando-se de imagens do surreal. Afirmo com toda certeza que um dia já gostei de você. Mas se ainda gosto permanece um mistério...
Se um dia cheguei a escrever uma confissão a respeito do inconfessável tal qual se encontra abaixo:
"Eu queria poder te contar o que aconteceu comigo nos últimos meses. Queria ser capaz de contrariar o meu bom senso e fazer algo a favor da minha sanidade mental. Infelizmente, meu aprisionamento emocional parece intransponível como sempre parece ter sido. Ou talvez não... Analisando em retrospecto, talvez eu esteja presa dentro dos meus próprios sentimentos porque libertá-los não significou uma coisa boa na minha última tentativa. Apesar de que essa parece apenas uma justificativa construída a partir de um encaixe conveniente de acontecimentos passados no presente. A verdade é que sendo a pessoa realista que sou - ok, pessimista - não consigo ver o lado positivo da situação, nunca."
Então só me resta concluir:
Gostava, gostei, não sei se ainda gosto. Será que gostaria?
Se um dia cheguei a escrever uma confissão a respeito do inconfessável tal qual se encontra abaixo:
"Eu queria poder te contar o que aconteceu comigo nos últimos meses. Queria ser capaz de contrariar o meu bom senso e fazer algo a favor da minha sanidade mental. Infelizmente, meu aprisionamento emocional parece intransponível como sempre parece ter sido. Ou talvez não... Analisando em retrospecto, talvez eu esteja presa dentro dos meus próprios sentimentos porque libertá-los não significou uma coisa boa na minha última tentativa. Apesar de que essa parece apenas uma justificativa construída a partir de um encaixe conveniente de acontecimentos passados no presente. A verdade é que sendo a pessoa realista que sou - ok, pessimista - não consigo ver o lado positivo da situação, nunca."
Então só me resta concluir:
Gostava, gostei, não sei se ainda gosto. Será que gostaria?
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