domingo, 26 de agosto de 2012

Correntes

O que me impede de sair? Que raízes são essas que me prendem tão firmemente ao chão?, não me lembro de cultivá-las. Lembro de querer ser livre. Indago-me, se ainda que inconscientemente, sucumbi ao peso da solidão. Escolhi a comunidade por não querer arriscar minha pele, escolhi uma segurança que apenas me limita. Não quero ser limitada, mas não sei como transpor as barreiras. Sim, as barreiras me são impostas tão somente pela mente, e por isso são tão intransponíveis. Minha mente é o que me torna diversa em meio ao confronto - será? Não me diferencio, assimilo-me aos demais na mediocridade para ter uma companhia ao final do dia. Agarro-me a um ideário tão somente aristocrático antiquado patriarcal - que seja -, sim, não consigo transpô-lo, fico acorrentada, é mais seguro.

Mas como me libertar? Quero muito sair, por favor deixem-me sair! Percebo, tarde demais, não devia ter esperado que a iniciativa viesse de fora para dentro. Tenho que deixar-me fluir, impelir-me para fora, sair sem pedir para que me deixem, que me tirem daqui, que me salvem. Entrego-me à minha cama quase como se fosse ela também uma extensão do meu corpo. Enrosco-me em meu cobertor, segura. Não tenho sonhos senão aqui, e ainda assim são sempre pesadelos. Não tenho porque sair, por mais que esteja presa, sufocada, angustiada. Como vencer essa agonia se é só nela que acredito?

Escrevo, e percebo o horror que é escrever - ainda por cima dizer em que acredito. No nada, nas coisas negativas. As coisas têm o peso que damos a elas, o problema não é externo, por mais que seja mais simples atribuir às causas exteriores aquela culpa inerente e inevitável, aquela culpa que é só nossa - Não, não, não, eu fiz tudo o que pude, não havia mais nada que pudesse ter feito, pelamor o que você gostaria que eu tivesse feito, queria que eu me destruísse? Não sabes o esforço imenso que faço para me manter inteira todos os dias, para levar esse edifício instável a passear, no passo-a-passo monótono e irrelevante do dia-a-dia. Não tenho sonhos, exceto em meu sono, e ainda assim são pesadelos. Estou sendo perseguida, querem eliminar-me e o pior de tudo é que meu algoz é minha própria mente.

Recorro à uma válvula de escape, cedo e trago a paz interior. Nunca senti algo tão sublime, nunca fui tão alheia ao que estava em volta, por mais que tudo aquilo me oprimisse, deprimisse, sufocasse, tudo o que fiz foi sorrir como se o sorriso impresso em minha cara fosse o natural,

E devia ser o natural, porque tudo aquilo era tão pequeno, tão tão minúsculo, mas eu aumentava as coisas, precisava de uma lente de aumento para analisar a fundo meus sentimentos, calcular minuciosamente o alcance das decisões, pesar as consequências. Tinha medo que as coisas se encolhessem de maneira tal a desaparecerem completamente, e assim agarrava-me com esse apego exacerbado. Mas era tudo costume, devia ser vencido. Ah, parecia tão fácil a elas simplesmente dizer isso. Eu, por minha vez, sabia da força secular do costume, sabia o quão intransponível ele podia ser.

Deixa pro seu "eu do futuro" resolver isso, seu "eu do presente" pode fazer o que quiser. E as dimensões do tempo funcionam assim de maneira tão inarticulada? Não, são elas que agem e influem sobre nós de maneira dinâmica passado-presente-futuro, nossas lembranças formam o que são, e nós agimos em função do que gostaríamos ser. Mas entendo agora o que você, tão simploria e perfeitamente quis me dizer. Não preciso rebater o jeito com o qual lida com sua vida tão ferrenhamente, de maneira tão acadêmica.

Só não pense tanto assim, cara.

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