Não era mais a mesma coisa e ele não sabia o porquê. Mas era fato que as coisas tinham mudado, já que aqueles olhos não tinham mais o mesmo poder sobre ele, não mais encontravam-se no teto de seu quarto todas as noites. Aquela garota na soleira de sua porta era capaz de pesar em seu coração como jamais pesara, mas sua desolação, seu desconsolo, o cabelo bagunçado, o suéter largo que denunciava como estava agora ao abandono, apenas lhe causavam pena.
-Tadinha, tadinha - ele sussurrava, com a cabeça dela contra o seu peito, com suas mãos passando pelos seus cabelos macios.
Mal podia acreditar que estivera tão perdidamente apaixonado por ela pelos últimos meses. Agora só sentia aquele peso, aquele peso que não queria carregar. Não conseguia sustentar aquele olhar desesperado, aquele apelo silencioso que ela sempre lançava sobre suas costas. Todo aquele desespero não era por ele. As migalhas daquela que amara tão desesperadamente estavam agora em suas mãos, e ele temia não conseguir colocá-las em seu devido lugar, temia causar mais dano do que reparo. Queria tê-la para si - ou melhor, quis tê-la para si durante muito tempo, mas ela sempre segurava sua mão frouxamente, sempre apartara seus abraços. Sempre quis outro. Ainda queria, e se pudesse estaria com ele. Ele sabia de tudo isso. Contudo, por tanto tempo não quis outras, não conseguia encontrar em mais ninguém aquele sorriso nos olhos, aquela constrangedora concepção de abandono, aquela estranheza que de alguma maneira lhe arrancara tantos suspiros. Queria apenas ter seus dedos entrelaçados com os dela.
Ela esperava alguma ação por parte dele. Estava ali, com a cabeça em seu ombro, de mãos dadas, olhos entreabertos. O desespero martelava, a náusea nunca seria suplantada. Ele se desvencilha dela, sai de fininho. Vai procurar conforto no aposento seguinte, os olhos dela não estão mais no teto de seu quarto. Mas ele conseguia farejar o desespero dela, enquanto as mãos dela ainda se agarravam à manga de sua camisa.
O que fazer? Não era mais o mesmo. Ainda segurava a mão dela com firmeza, rezando para que seus batimentos voltassem ao normal, confortava-a para que não se sentisse mais claustrofóbica, acariciava-a porquanto sabia que iria acalmá-la, iria refrear as lágrimas dela. Lágrimas que desaguavam por conta de outro. Havia de oferecê-la o conforto que pudesse, mas seu conforto encontraria em outra.
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