Ela amou a outra desde o início, quando se deu o primeiro sorriso tímido, ajeitou o cabelo detrás da orelha deixando os piercings à mostra, desviou o olhar após encará-la brevemente. Amou-a e soube que era correspondida antes mesmo que a outra tomasse consciência que amava de volta. As coisas mínimas tem um jeito ininteligível de acontecer, o cérebro nunca consegue traduzir, percebemos alguns detalhes apenas em retrocesso - sendo que muitos deles são inventados por nós mesmos.
A garota amava-o apenas à distância, e ainda assim relutava em utilizar-se da palavra amor, era algo que possuía um peso inerente, talvez por causa da promessa da eternidade. Era muito nova e gostava de ficar sozinha. Passaria a amá-lo apenas depois que partisse. Marcou no calendário, escreveu-lhe cartas que nunca entregou, rasgou-as sem que pudesse relê-las. Descobrir seus próprios sentimentos depois que não mais os sentia era sempre coisa de absurda estranheza, como se tivesse de conhecer em si mesma outra pessoa.
Talvez eu devesse pausar mais vezes durante essa história para pesquisar palavras no dicionário. Contudo, estou cansada de recorrer às consultas para saber como me sinto, como devo me expressar, como devo proceder. A compreensão ideal é inatingível, mas tudo que sempre almejei foi compreender o que estava acontecendo ao meu redor. Não faço mais isso, pois não aconteço. Fui pega pelo marasmo, abraço o imobilismo. As duas sabiam que ambas se amavam, mas disso foram proibidas. Tantos desencontros, empecilhos, dificuldades auto-impostas... Foram, enfim, deixados de lado. Talvez o amor espere, seja paciente, duradouro, onipresente. A paixão, no entanto, clama com urgência, se retroalimenta assim como se consome na espera. A paixão não espera. O amor não existe, é impronunciável, enterra-se sob seu próprio peso.
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