O que dizer? Nunca me senti tão amada, e também nunca me senti tão livre. Não tenho alguém, tenho toda gente que já conheci e, ainda assim, tenho a mim mesma. Não tenho direção, mas uma coragem inenarrável, insuperável surge em minhas mãos. Tenho o poder da criação, ainda que escolha não utilizá-lo. Por muito tempo olho para a parede, observo uma paisagem imaginária, desperdiço, vivo plenamente minha vida burguesa. Sou filha de meu tempo, afinal.
Usurária, usurária!, exclama a consciência. Quero tudo de volta e em dobro. Não sou de me dar, por vezes me empresto. Terás um momento e é bom que dele não se esqueças. Posso enforcar-me com correntes no ato da luta pela libertação, mas não trancarei conscientemente meu coração.
Você me escapuliu em questão de instantes. Não é que tenhas fugido, eu que o expulsei, ainda que sem forças, ainda que sem compreensão. Não aprecio àqueles que não me apreciam, parece discurso e bobagem, mas foi lição bem aprendida, SS em histórico escolar.
Nunca me senti tão amada - e tão mal acostumada. Esperneio quando não ganho atenção, é meu jeito de brincar. O amor materializa-se em presentes, mas também em gestos. Aquela ligação, aquela frase, aquela presença; o afago no escuro, a espera enfim finda, todos habitam permanentemente meu corpo e transbordam em correspondência.
E, se tudo isso me parece insuficiente, inalcançável, se nada me atinge - ou acaso me atinja em demasia -, Clarice e Virginia me entendem. Ah, a alegria mansa, a felicidade natural!
[E você também, Raquel. Ao menos quero mais que tudo que me entenda]
É na solidão que me esbaldo, que sou plena. Caso me for fragmentar mais uma vez, espero ao menos despedaçar-me em milhões de pedaços, num estatelamento irreversível, ser acidente de trânsito e não placa de pare!, virar areia, poeira cósmica - explosão orgásmica.
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