segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Esboço do Diálogo

-Acho engraçado.
-O que?
-Isso de você ficar voltando pra mim, sem querer voltar.
-Não entendi.
-Ué, acabou, mas você fica voltando. Porquê? Não é frustrante pra você?
-Não tenho essa visão das coisas.
-Bem, pois é frustrante pra mim, isso de você ficar voltando sem querer realmente voltar.
-Você sabia que eu estaria aqui, veio por que quis. Sabia que ia me encontrar.
-É, deve ser culpa minha mesmo.
-Você tem muitos outros lugares onde poderia estar. Porque não está com o Bruno?
-Porque ele foi embora.
-Gustavo?
-Bem, ele sempre está quando eu preciso dele.
-E você não está quando ele precisa de você.
-Ele me procura, aí nós damos um jeito.
Silêncio.
-E aquele cara do sábado passado?
-Um erro que não pretendo voltar a cometer.
-E eu, aqui?
-Você não está aqui de verdade. Está, mas não queria estar. Que nem quando estava comigo. Não fazia questão, flutuava em pensamento pra outro lugar. Não sei porque fica voltando, se queria tanto ir embora. Queria que fosse de vez.
-Não me procure mais, oras.
-Não te procuro, você que sempre me acha. Ou você acha que é acaso?
-Talvez tenha que ser assim, a gente buscando um ao outro alternadamente. Talvez a gente ainda se encontre.
-Não quero brincar de pique-pega com você mais.
Mais outro silêncio. Dessa vez ele não tinha uma resposta rápida, e sagaz. Desviou o olhar do dela.
Ela tocou-lhe o rosto. Ou ao menos almejou que pudesse, mas seu corpo não se moveu. Tinha medo de que o toque fizesse com que ele se esfacelasse.
-Desculpa.
O tom dela era baixinho e sincero. Não havia mais ressentimento.
-Pelo quê? - de repente, surpreso. - Eu que te devo mil desculpas, e nunca conseguirei pronunciá-las todas.
-Por não te dar compreensão, por não ter persistido ao seu lado. Não sou uma pessoa tão boa assim, sou egoísta. Não vi como te dar algo que não parecias disposto a receber. Não vi como me dar a ti, sabendo que não seria retribuída.
A dádiva, sim. Disso também era feito o amor - dar, receber, retribuir.
-Não fomos dádiva - ela continua. Talvez ele não entendesse plenamente a alegoria, não seria novidade. Nunca haviam conseguido se entender. - Fomos tragédia. Por isso esse gosto amargo em nossas bocas. - ela inclina-se e dá-lhe um suave beijo de língua. - Por isso que meu toque é hesitante e frio. - desliza a ponta dos dedos pela nuca dele. - Por isso essa sensação de tristeza que nunca vai embora.
-Por isso venho, sem querer voltar.

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