sábado, 21 de abril de 2012
Ar
Então chegaria o momento em que o mal estar não seria decorrente de não ser correspondida e sim por não corresponder? Por ter consciência daquilo que eu estava deixando pra trás, por saber que aquilo me era bom e o que tinha a me oferecer só me faria bem. E eu cerrei os olhos com determinação, apenas continuei tateando o ar à minha volta, segui rumando despreocupadamente em direção ao abismo. E tudo que sentia era alívio. Alívio pois o ar que eu tateava me era dado por simplesmente estar lá, não como oferenda de um ente nada obsequioso que exigia algo em troca, que me envolvia com suas garras e me sufocava. Pelo contrário, ele me acariciava gentilmente a face, entrava por minhas narinas doce e partia discretamente, sem se anunciar. E era somente esse ar que repousava por sobre meus ombros, como brisa fresca acalentadora. Não sentia mais o peso de outros braços, de outras expectativas, de qualquer sentimento que visava mais cobrar do que dar-se a outrem. Sentia a liberdade em seu sentido pleno - não uma liberdade conceituada, de direitos, de sexo, ou qualquer que fosse a que estivesse em voga nas agendas políticas - mas aquela que era uma sensação. A mais importante, porque sentida, e não teorizada. Sabia que não tinha preceitos morais a atender, não tinha hora pra voltar pra casa, não tinha que pedir permissão, não tinha que andar cuidadosamente para não pisar em ovos. E só saber isso era o suficiente. Não que fosse desconsiderar o sentimento dos outros, ou que pretendesse fazer apenas a minha vontade - a questão era não ser obrigada à vontade de terceiros. O sentimento me invadia o peito em ondas de calor. Nunca me sentira tão bem comigo mesma.
(Lutei em vão, continuava cerrando os olhos com todas as forças. Mas já estava acordada, e o ar do cárcere era abafado e quente. Contudo, a memória sentimental havia permanecido).
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