sábado, 21 de abril de 2012
O medo
Não saberia descrever exatamente medo de quê. Só sabia que sempre fora uma pessoa muito medrosa. Com o passar do tempo, começara a ignorar seus medos, o que não significava de maneira alguma superá-los. Sua predisposição à indiferença era infinitamente maior que à superação, o que demonstrava uma covardia que se tornava cada dia maior. Através de racionalizações cada vez mais irrefutáveis em sua mente, convencia-se de tudo aquilo que não valia a pena. E era tanta coisa! Falar, confiar, esperar - todas as preocupações, ânsias e receios eram vãos. Contudo, nem por isso deixava de tê-los. Apenas tornara-se demasiado hábil em suprimi-los, fazer pouco deles. A decepção era a única coisa certa na linha do horizonte, e quando ela chegava era como se fosse uma convidada há muito esperada. "Fez boa viagem? Estávamos só esperando você chegar para servir o jantar". Era um jeito de lidar com as coisas, mas era o jeito mais covarde possível. Não era apenas um medo de algo específico, era o medo. Tinha medo de tudo e, de tal modo, fingia nunca esperar nada além daquela convidada indesejada, porém que chegava sempre de sobreaviso. Por isso era fácil desvencilhar-se de tudo, olhar com frieza nos olhos de outro e dizer "Eu já esperava isso de você". Não porque não houvesse sentido coisa alguma, não porque não tivesse almejado a coisas maiores - e sim porque era a única maneira de lidar com a única certeza que conhecia. Os cortes aparentavam sempre ser limpos, mas os membros amputados continuavam latejando por meses a fio, em períodos de latência cada vezes maiores e mais frequentes. Os fantasmas sem dúvida assombravam mais do que "a coisa real". E como não havia superação alguma, os medos apenas continuariam a se acumular naquele monstro disforme e incompreensível.
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