domingo, 14 de julho de 2013

Teu silêncio, meu alívio

Bem sei que poderias me mandar notícias. Vejo-te trancado em seu quarto parcamente iluminado, onde luzem apenas a tela do computador e o sol poente que invade as frestas das cortinas. Teus livros estão amontoados na escrivaninha, tuas dúvidas todas jogadas e embaralhadas frente aos teus olhos cansados, tuas mãos inquietas a bagunçar teus cabelos. Construíste para ti, com êxito exuberante, este gabinete hermético. Do alto de tua torre, idealiza tons incandescentes para quebrar com teu cinza, descontrair teu cenho. Meu cinza não te indica o que desejas alcançar. Bem sei. Estamos juntos apenas em confusão e desarmonia – no austero monotom. Não sabes. Estás tu em tua torre; eu entregue ao sumidouro. Te dignas a baixar os olhos brevemente. Não me reconheces em minha verdadeira forma. E a verdade que sei, muito embora te supondo nessa torre imponente, cujo cimo corta impiedosamente o céu fechado, é que transbordas de fosso profundamente escavado. Suponho.

Regozijo na tua falta de notícias. É aí que anseio a quebra da monotonia, contendo-me contente na contemplação da memória de tua figura esguia. Não preencho teus silêncios com minhas fantasias. Tão somente teus silêncios que fazem cessar o fluxo excessivo da minha consciência demente. Preencho teus silêncios com os meus, tecendo a mais perfeita sinfonia. Te acalmes. Não fales, pois que nosso entendimento mútuo é a ausência de palavras. Deixo esparsas ondas de tua maré baixa expurgarem minha costa. Costas retorcidas, deformidade causada por desorientação. Leve pluma é meu sono nos breves momentos de descanso ao teu lado. Vento brando à beira-mar: sopras em meus ouvidos o meu próprio nome, em interrogação. Ouço o som das ondas varrendo a praia. Tuas mãos deslizam suavemente sobre mim por um breve momento. A mais breve carícia, até em simplicidade e hesitação. É a única que aceito. Gesto sincero.

Cala-te. Pois que não desejo de ti nada que seja insincero. Percebe, pois. É tua nau que acalma meu oceano inquieto. Explora (a)a vontade e no ritmo ditado pelo tempo! Explora também outros oceanos, ao passo em que permito que outros em mim naveguem. Mas, volta, porque és conquistador, não da presa inerte, nem do selvagem incapaz. Conquistador, contudo, de um indivíduo que te aprecia e te respeita. Conhecedor de águas profundas. Faças uso dos meus silêncios e perdoai minhas metáforas, ainda que delas te esqueças – quando do alto de tua torre. Fecha-te de mim, hermético. Agradeço tua distância, meu espaço de ar doce e puro. Teu silêncio é meu alívio.

O que digo nunca é o que sinto. O que escrevo é o que invento de mim. Nada me proponho a contar, o mundo é só decepção e o que me passa não é memorável. Mas as memórias me sufocam. Tento organizá-las cronologicamente, causa-e-consequência, linha ascendente. Algo faz sentido? Ah, a razão! Poderia utilizá-la para compreender, mas já a perdi há algum tempo.

O REVÉS DO VIÉS EM SUA CONTRAPARTE.

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