Porque a força de uma ideia me alça um lance de escadas acima, impulsiona meu punho fechado a bater em sua porta, abre meus lábios em sorriso, ainda que incerto; enche de ar meus pulmões ainda que me deixe ofegante. Não tenho escutado nada além das vozes da loucura em minha mente, ainda que os outros tenham tentado me dirigir a palavra, a linguagem é distinta e eu não a compreendo. Não tenho escutado porque não estou pronta para ouvir. Deixam-me às voltas com minha própria solidão, geleira envolta por lava, eterno calafrio, ruminação pútrida, indigestão com arroto fétido. Fico porque não escuto quando me chamam, apesar dos ecos dispersos, ondas sonoras que colidem nas paredes de gelo e apenas me confundem. Não sei pra qual direção devo me encaminhar para poder encontra-los, ou sequer se devo continuar a segui-los. Ah, o desencontro que se segue aos desentendimentos!
Estamos às voltas nos passos descompassados de uma dança desajeitada: tu valsas, aos tropeços, eu recolho-me ao fundo do salão: não sei dançar. Além disso, sua presença imobiliza-me todos os músculos, articulações, ventrículos, pálpebras, meus dois pés esquerdos, minha face pálida de profundas olheiras. Se dou um passo a frente, tu recuas. Ao ver-me recuar, avanças. Se eu vou pra frente, você vai pra trás, um dia hemos de nos encontrar. Parece-me uma lógica inexata e não quero mais dançar. Outras pessoas dançam ao nosso redor – num repente de desvario trocamos de par. A música passa a ser executada em tom mais suave, o ar do salão torna-se mais ameno. Outras mãos na minha cintura passam a me conduzir, com firmeza decisória que me faz entrar no compasso. O salão se desfaz, nada disso importa e estou em seu corredor.
Tu abres a porta, enfim, e o que te digo são incógnitos impropérios e lhe parece encriptado, também hablo outro idioma. Vielleicht ein bisschen Deustch. Não me alcanças, nossos olhares perdem-se no abismo da incompreensão. Não peço que me entendas, concedo resignada. Apenas peço asilo. Quero o aconchego dos teus afagos, olhos, sorriso e sofá. Quero tuas mãos em meus cabelos. Quero alguém com quem possa compartilhar silêncios. Não escuto mais, e quero também parar de falar sozinha.
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