domingo, 16 de novembro de 2014

Epístola esquecida

Àquele que não mais me lê: todos os dias em que foste consumido pela ânsia de que para ti eu escrevesse, agora revertem-se em minha espera tímida. Pouco pretensiosa, envergonhada de si mesma. Assim como eu mesma me encontro. Tendo minhas investidas esparsas rejeitadas. Compreensivelmente. Sei que eu mesma já escrevi alertando-o para meu próprio perigo, meu desespero. Pedi para que se afastasse, e é como se me acatasse obedientemente. Exceto que não há mais parte alguma de ti que aja com expectativas com relação a mim. És indiferença, ou és cicatriz?
Agora escrevo para ti, mas não possuo palavras. Não como as tuas. Venceste no próprio ofício ao qual te apresentei. Desci do pedestal no qual nunca quis ser colocada e agora não sei mais onde me encontro. Meu apelo nem sequer tem confirmação de recebimento, tampouco recebe alguma resposta. É faísca parca. Um sorrigo amargo. Um café ralo que tomo junto com um cigarro de palha, do lado de fora da mesma biblioteca onde você costumava ficar. Mas você não volta. Compreendo, resignada.
Não possuo entendimento do que sinto, como também não compreendia o que se passava há mais de um ano. Iniciei esse flerte insensato e, emburrada, decidi: não quero mais brincar. Não sei rebuscar como sabes, como também não soube te amar. Persisto criança mimada que se recusa a aprender, e nem ao menos consigo te enganar. Se é que conheço bem meus artifícios, não sei em que medida me utilizei deles para te encantar. Se é que te quis, não quis que pudesses me enxergar. E continuo falando de mim incessantemente, como se ainda hoje não coubesse a ti qualquer poder de escolha.
Peço que desculpe ao menos esse texto fajuto, não consigo mais usar as palavras como antes. E sei que minhas tentativas de redenção são todas quebradas e voláteis, nuvens de éter no ar.

domingo, 28 de setembro de 2014

Tenho dias de horas púrpuras
anis
turvas.
Tenho dúvidas acerca da relatividade
do magnetismo
do atrito.
Também de mim e de ti,
mas é que a curva da parábola
hiperbólica, convergente
de nós dois
que gera atritomagnéticorelativo
- combustão –
dá pane em minhas sinapses nervosas,
por demasiado nervosas.
Irrequietas, irreflexivas, incongruentes.
Tenho silêncio e paz em mim,
e também o caos.
Mas quando tenho a ti, tenho tudo
tudo aquilo e mais um pouco
que beira ao Nada.
O que de mim te concerne,
e que penetras:
É superfície.
Tenho horas em universos alternativos,
em que sou singela,
apenas vazio escuro e oquidão.
Tenho segundos afetivos,
num microcosmo que é clarão.
É que se te difamo, pois!
só por ti tenho afeição.

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Uma quadra sem métrica

Minha poesia
Se insere entre dois pólos
É beleza, é dor
Mas nada de alegria

Uma quadra ao gosto popular

"Tenho um relógio parado
Por onde sempre me guio.
O relógio é emprestado
E tem as horas a fio. "

Fernando Pessoa

Life seemed less ordinary. Like I was made for love. And you were me becoming the myself I was meant to be.

E se eu te disser que nosso pior inimigo é o tempo, e não a distância? O tempo que flui tão naturalmente quando estou contigo, mas que esvai-se sorrateiro. Como uma ampulheta de areia. Que se arrasta dolorosamente quando estamos afastados. O tempo incomensurável que ainda nos resta para o resto de nossas vidas. Eu sei que não é como se você quisesse casar comigo. É que eu quero casar com você, quer dizer, eu casaria com você agora... Porque você é o amor pra mim, "amor que foi feito pra dar, mas que ninguém deu pra você". Você é a personificação disso, não como uma projeção bizarra ou uma distorção que eu faço pra que você se adeque a mim, digo acertado. Você foi infinite joy e blind understanding, e agora é um choro que não pode ser contido. É aquela vez, a que eu me sinto mais triste do que nunca antes, e que eu acho que vou morrer de tristeza. E eu me levanto. Porque me parece um desperdício não espremer tudo de mim pra te aproveitar. E você acha que eu não tento? Mas você é o meu primeiro amor, deveria também ser o ultimo? E essa nossa dinâmica distorce as nossas expectativas, que poderiam ser leves como a brisa marítima que toca nossas faces agora, suave como o ruido das ondas do mar. Só que acaba sendo a big bad monster. Meu amor é essa praia perpétua, é esse sossego que brota do seu peito e de suas mãos. Mas o tempo é inenarrável, irreflexivo, desempedido - vai a sua própria maneira, com velocidade relativa: quando quero que ele pare, ele acelera. Nos caberia usar um relógio parado? Mas eu escolheria o pôr-do-sol; você, o nascer do dia. Não sei se por questão de gosto ou só pra me contrariar, tentando fazer com que eu te siga. Indefinidamente. Eu vou atrás, mas com passos curtos e relutantes. You always said we'd meet in the middle. Só que você não me escuta. Eu sei que eu falo baixinho, mas você não olha pra trás.

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Meu coração está pequenininho, de tão apertado. Pulsa cansado, bate
calado. O esforço hercúleo não dissipa a angústia. Sim ou não, sim ou
não, sim ou não?, ecoa o ritmo moroso da agonia. Se eu pudesse
confirmar o não, ao menos essa luta findaria. Não há maço de cigarro
que apazigue essa tensão. Minhas mãos tremem, minha respiração dói.
Causa-me dor física. Sinto-te em minha corrente sanguínea,
entupindo-me as veias. Em minhas sinapses nervosas, corroendo meus
neurônios. De tanto pensar, de tanto sentir... Concluo: não consigo
amar, pois não consigo sofrer. Ou o problema é de outra ordem? Consigo
amar, consigo amar com a intensidade da troca de olhares ininterrupta,
com a abruptidão do toque, com a fluidez do pensamento. Mas não sou
capaz de grandes gestos. Então me ocorre... eu é que sou inamável.
Antes nunca tivesse sido amada, antes nunca tivessem professado amor
algum por mim. Mas eu não sei me fazer digna desse pedestal imposto,
quando me sei mundana e profusa. Não sei mudar por alguém e não mudar
por mim. Não sei permanecer, estatizar. Não sei...

E sinto frio. Frio em meus ossos, frio em minha alma. O anjo que me
toca traz com si uma foice, é o anjo da morte. Sua penugem não irradia
mais o reflexo dos raios de sol, enegrecendo-se frente ao meu abismo.
Contaminando-se com minhas lágrimas sujas de lama, minha culpa
condensada. O amor não (me) salva, tampouco (me) basta. O que eu
quero? Não é que já não sabemos mais, eu nunca soube... Nenhuma
resposta permanece frente ao golpe das novas perguntas, o nevoeiro das
dúvidas. Que paira sobre minha cabeça, que intoxica os meus pulmões. É
gélido e cortante. É fatal. Se eu não dependesse de outrem, se eu
apenas me entregasse ao abraço do anjo da escuridão. Se eu me
entregasse ao abismo. Tentei ser luz, tentei viver plenamente o verão.
Não posso. Cri que teu conforto aplacaria minha solidão. Não podes. Tu
crês em deuses distintos, e eu apenas vejo escuridão. Não há branco
que não se suje. E permaneço nesse tom cinzento relutante, enquanto
meu anjo espera minha resignação para que possa me tingir de negro.
Agora morre a muda em mim plantada, que antes floresceu na primavera.
Caducifólios, todos nós. Perenifólio você, que resiste à mudança das
estações. Somos espécies diferentes. Tentei ser verão, mas o frio me
toma para si. Minhas mãos geladas tremem. O anjo me estende a mão. Eu
peço por mais tempo, eu vos suplico, sou jovem, tempo é que não me
falta. Ele toca minha face com seus dedos finos. Não sinto mais frio,
e ele promete que não vou mais sentir. Eu o abraço, peço perdão. Já é
tempo, diz o anjo docemente. Ele me consola com seu abraço etéreo.
Abrace o inverno, logo mais serás verão novamente. Eu o seguro
firmemente, eu te suplico, já não aguento mais uma mudança de estação.
Ele aplaca meu aperto feroz, é a passagem inevitável dos anos, minha
querida, até que eu me utilize desta foice em ti. Meus pensamentos não
se materializam, mas ambos sabemos o que passei a idear. Sem ideias
tolas, ele diz em tom definitivo. Eu fito intensamente seus olhos de
gelo, passando meus dedos por seus cabelos cor de neve. Toma meu
beijo, anjo guerreiro, que junto contigo também vou guerrear. Sinto
seus lábios gentis, sua língua sutil, o gosto das suas lágrimas. Eu te
amo, ele diz firmemente, eu estarei aqui conquanto estiveres decidida
a vencer o inverno interminável em seu coração. Eu te amo não de te
imaginar, é de te sentir, de te metabolizar - continua, ainda com os
braços envoltos em mim. E eu sinto os raios de luz que dissipam o
gelo. Eu sei.

segunda-feira, 7 de julho de 2014

Oferta de último minuto, é take it or leave it. Você não é insubstituível, pode ser o primeiro de uma longa lista, ou a quinta opção. Não tem tu vai tu mesmo, e não é pra ser assim? Quem se valoriza não pode se dar ao luxo e valorizar aos outros, mermão. Aqui é a selva dos lobos, devore antes que tu seja devorado. Aprenda tua lição. “Mas dessa vez é diferente, dessa vez é especial”. A gente segue se enganado nesse longo ciclo de decepção, até que não se sinta mais o ferro frio do punhal. A primeira vez é que é tragédia, disse o Marx, a segunda é farsa. E a terceira, a quarta, a quinta. Só chorar que sempre adianta, cara, sempre adianta. Lágrimas deixam as pessoas desarmadas. E não é porque elas acreditam em você, é porque elas acreditam no poder delas mesmas sobre você. Pra que chutar alguém que já tá no chão? Eu me recuso, eu me recuso em reclusão. De agora em diante você não entra mais, não. O pior é que o teu próprio cinismo só te corrói. As bruxas seguem às soltas, em procissão, agourando o sofrimento mudo. Mas são teus próprios demônios que te consumirão.

quarta-feira, 25 de junho de 2014

“Eu sinto sua falta”, é o sussurro mudo que não transpõe meus lábios finos. É o protesto interior que não supera a barreira de minha garganta rouca. Não saber onde ele está é liberdade. Não saber onde eu estou é a realidade. E o amor, como ficou? Não foi sufocado, liberou-se de garras afiadas para que pudesse prevalecer. Então ele é metafísico... Pior do que não se poder aprisionar, é não se poder compreender... Será que eu o inventei? Será que eu te inventei? Eu me reivento todos os dias para me acabar igual.

O apelo desvanece
O afeto prevalece.

“Vamos ser estupidamente felizes enquanto é tempo”, eu quero te dizer enquanto beijo suavemente sua têmpora, invadida por uma felicidade que só você pôde me apresentar. Mesmo que eu me agarre a ti com toda a força, mesmo que eu durma em cima de você com a cabeça no seu peito, não vamos nos fundir... Percebe o erro? Dois corpos não ocupam o mesmo lugar. Mas, mas o amor é meta-físico, e não Física. Ele não obedece, ele é teimoso, ele é? De ser, de presença? O que será que Heidegger pensava disso?

Você cala minhas indagações com um beijo preciso, de sutileza e ritmo como só você faz... Lembro-me de quando cantarolava pela casa envolta num cobertor “só tinha de ser com você, havia de ser com você”, o coração quase explodindo dentro do peito, porque não cabia mais, porque queria voar. É, ele é, é o amor. Mas era. Não é mais assim, é de outro jeito. É de lembrar da sua gentileza, de que você cuida de mim. Só que você diz que não quer mais filosofar, “vamos deixar a filosofia pra próxima vida que essa a gente vive”. Eu que desperdicei tanto tempo com filosofia alemã... Ser e Tempo a gente descobre, a gente explora, a gente não universaliza. Cada um faz por si só e daí a gente se encontra. “A gente se encontra”, eu insisto honestamente. Mas é que eu + você era nós, agora eu sou eu' e você é você', não sei o resultado da soma desses fatores... É que eu tenho essa ilusão de que eu tô sempre mudando. É que a gente tá sempre se conhecendo cada vez mais, sem conseguir conhecer tudo do outro.

“Não precisa ter medo”, e eu precisaria de um superlativo pra insistência, porque de tanto insistir, e de tanto tentar te convencer eu vi que eu estava tentando convencer a mim mesma. É que eu não sei, sabe? Eu sei que você sabe, que você acha que sabe, e está tão envolto em suas certezas e uma das suas certezas é o seu amor por mim... E daí como eu fico? Cruel. Eu fico sendo a pessoa mais cruel que eu já conheci em toda a minha vida, porque não importa se eu choro todo dia, se você chora todo dia, e se nós continuarmos chorando separadamente... Porque o que eu quero é te ver sorrir, mas eu queria poder sorrir também. É, era isso que eu queria. Dá pra acreditar? Mas aí eu venho pra você com essa proposta abstrata, de que não quero casar e que só quero sorrir. Você só diz “eu também não quero casar, quando eu disse que queria casar?”. Mas não é esse o ponto, não é - o ponto é. Um ponto final? Não, eu ponho reticências, são vários pontos, afinal. Será que eu é que não sou clara? Desculpa, eu sei que você não quer mais filosofar... Eu não posso te dar só o que você quer, sabe?

“Só vamos ser estupidamente felizes, será que a gente ainda consegue?”.

O afeto prevalece, só um pouco cansado...